Ming Liu é o coordenador executivo do Projeto Organics Brasil, uma entidade sem fins lucrativos que trabalha a imagem do Brasil Orgânico no mundo. O projeto reúne empresas exportadoras de serviços e produtos orgânicos. Hoje são 60 associados, que – juntos – fecharam 2014 com US$ 136 milhões em negócios. Ming Liu é o interlocutor do setor de orgânicos do Brasil em comissões internacionais, feiras, missões comerciais e participa dos grupos de estratégia e tendência mundial do setor de orgânicos. 2a2a41
Liu conversou com o Organics News Brasil na volta da maior e mais importante feira mundial de negócios orgânicos, a Biofach, que reuniu mais de 2 mil expositores de 160 países e 44 mil profissionais do setor.
O setor de orgânicos fechou 2014 com saldo positivo. Como foi o ano para o setor?Qual a expectativa para 2015?
Não vou dizer que 2014 foi um ótimo ano, até porque tivemos um ano atípico, com os eventos da Copa, que afetou a economia em sua totalidade, aliado a uma crescente falta de confiança dos consumidores. No caso dos produtos saudáveis, e neste caso os orgânicos estão presentes, não foi um ano fácil, pois apesar da crescente demanda por parte do consumidor, a escala ainda prejudica o desenvolvimento do segmento, a estruturação de logística para os mercados ainda encarece o produto na ponta do varejo; e ainda carecemos de um programa de educação para o consumidor final, em sensibilizar que nem sempre preço final deva ser o critério para a decisão de compra.
No entanto, o setor vem apresentando a cada ano novos produtos e o mais importante é a oferta de produtos com valor agregado. Com o aumento de investimentos em capacitação e inovação na linha de produção, os resultados mais práticos parecerão no futuro.
A primeira feira de negócios de 2015, a Biofach, em Nuremberg-Alemanha, indica que a tendência mundial para o setor é de crescimento. Esse ano, teve 5% a mais de profissionais no evento, novos mercados em prospecção, como os países asiáticos, novas empresas com desenvolvimento de produtos que procuram os produtos da biodiversidade brasileira como valor agregado. Acreditamos que poderemos manter a média de crescimento de 10%.
Quais as explicações para o crescimento mundial de produtos saudáveis?
O mercado mundial, e não diferentemente no Brasil, vem apontando que os consumidores procuram produtos que tragam mais qualidade de vida, menos química e não sintéticos. A busca por produtos que utilizem princípios mais naturais vem crescendo e, cada vez mais, o consumidor lê e procura se informar com rótulos e pesquisa seus efeitos em longo prazo.
Os atuais consumidores têm se mostrado, nas diferentes gerações (Baby Boomer, X, Y e Millenio), interessados em ar as informações nos canais de mídia, de forma que hoje o produto acaba sendo em parte pesquisado antes de ser consumido. Neste processo, o consumidor procura se informar não somente sobre o produto, mas o que está por trás dele: quem produz, quem fornece, quem consome e se ele se identifica. Os atributos, em sua maioria, refletem seus valores e crenças na vida. No caso dos produtos orgânicos na Europa, Ásia e Estados Unidos, as histórias por trás dos produtos é fator de avaliação na decisão de compra.
E qual o diferencial do Brasil nesse mercado?
O que pode explicar esta tendência de crescimento é a riqueza de nossa biodiversidade, onde em qualquer bioma encontramos produtos típicos que remetem a imagem de saudabilidade e bem estar, difundidos em todos os mercados globais. Tendências de produtos como as frutas da Amazônia (açaí, guaraná), castanhas do cerrado (caju, castanhas do Pará), açúcar, mel e uva do Sul, enfim são alguns dos ingredientes que vemos aflorar como produtos finais nos mercados.
Muitas empresas exportadoras apostaram no mercado interno em 2012-2013. Qual a estratégia agora que o câmbio é favorável às exportações?
Há cinco anos, o mercado internacional sem dúvida tinha um peso maior, até por falta da regulamentação no mercado interno que só ocorreu em 2011 com a criação do selo nacional de Produto Orgânico (MAPA). Atualmente o mercado doméstico tem um peso maior e onde a maioria das empresas tem investido, seja na inovação com criação de novos produtos, seja na importação de produtos ainda não produzidos no país.
O importante é que temos notado que a cadeia produtiva interna vem se capacitando e lançado uma série de produtos e, a cada dia, nos surpreendemos com este crescimento. São empresários que decidem empreender e veem nos orgânicos não apenas uma oportunidade comercial, mas uma filosofia de vida positiva que adotam e se identificam.
A internacionalização de muitas empresas de orgânicos é uma realidade e a maioria se dá muito bem nos mercados consolidados, como: Estados Unidos, Alemanha, França, Reino Unido e Canadá.
Qual a realidade da produção de orgânicos hoje no Brasil?
Em 2013, o mercado representou cerca de R$2 bilhões e, para 2014, este número cresceu 25%. As regiões Sul e Sudeste registraram aumento na produção primária, porque o número de certificações é mais representativo.
Segundo o Ministério da Agricultura, há cerca de 13.000 unidades produtivas certificadas, com crescimento em cerca de 30% de 2013 para 2014. As exportações do Brasil de produtos orgânicos devem fechar em 2014 na ordem de US$140 milhões (US$ 136 milhões só das empresas ligadas ao Organics Brasil) É pouco se comparado ao mercado global que é quase US$ 70 bilhões. Certamente, há potencial para ser desenvolvido no Brasil. Fiz uma apresentação no Congresso da Biofach com esses números e os empresários estrangeiros acham que temos muito potencial de negócios (apresentação disponível para )
Quais as perspectivas para 2015? O setor continuará crescendo?
O setor continuará crescendo nos próximos anos e temos como meta chegar em 2020 com um mercado de R$10 bilhões.
Quais os desafios?
Acho que antes de apontar os desafios, devemos conhecer nossas oportunidades, e no caso o Brasil, não podemos de deixar citar que – por abranger uma das maiores biodiversidades do planeta (15% a 20% de toda a fauna e flora mundial)- tem uma enorme gama de matérias-primas, uma grande variedade já utilizada por empresas em sua forma convencional e outras que ainda não foram trabalhadas com a certificação. Cada vez mais, a indústria mundial vem prospectando novos fornecedores e matérias-primas em diversos países na África, Ásia, América do Sul na busca de novos produtos com suas características naturais e associando a ideia de buscar de forma sustentável na sua origem; mantendo as atividades de extração e produção dos ingredientes, respeitando as limitações culturais e econômicas da população local onde se extrai; e garantindo que não cause nenhum impacto ao meio ambiente.
Entre os desafios, podemos citar que o maior será como ar credibilidade ao consumidor final, educar e conscientizar de sua importância. Outro grande desafio nas estratégias de sustentabilidade é agregar valor aos produtos e construir valor na cadeia. No Brasil, levará alguns anos até termos produtos de todas as cadeias como já encontramos na Europa e nos Estados Unidos.